DIREITO - Sociologia Juridica, Modernidade e a Ciencia do Direito


SOCIOLOGIA JURÍDICA, MODERNIDADE E CIÊNCIA DO DIREITO


Como sabemos a modernidade traz à sociedade um conjunto de inovações que beneficiam e, ao mesmo tempo, provocam conflitos. Esse paradoxo é analisado no decorrer do desenvolvimento por autores de renome como Marshall Bermann, Miguel Reale, Alain Touraine et al.
A sociologia jurídica também é discutida sob várias óticas, possibilitando assim uma maior compreensão de seu objeto, do campo de atuação e dos problemas que a ela aparecem.
O direito como Ciência é amplamente discutido, a norma jurídica é estudada sob os mais diversos prismas jurídicos, elaborados por Tércio Sampaio, Miguel Reale, Hans Kelsen, Karl Marx e outros.

SOCIOLOGIA JURÍDICA, MODERNIDADE E CIÊNCIA DO DIREITO


“O que é modernidade, cuja presença é tão central em nossas idéias e práticas após mais de três séculos e que está em discussão, rejeitada ou redefinida, nos dias de hoje?” Esta é a pergunta que faz Alain Touraine na apresentação de seu livro, entitulado “Crítica da Modernidade”. Segundo ele, seria a afirmação de que o homem é o que ele faz, e que, portanto, deve existir uma correspondência cada vez mais estreita entre a produção, tornada mais eficaz pela ciência, a tecnologia ou a administração, a organização da sociedade, regulada pela lei da vida pessoal, animada pelo interesse, mas também pela vontade de se liberar de todas as pressões. Já Marshall Berman, define-a como sendo um conjunto de experiências de cada indivíduo consigo mesmo e com os outros. Mas não é mansa nem pacífica a questão. Pois a modernidade, ainda sob a ótica de Berman, é um paradoxo, uma unidade de desunidade, pois ao mesmo tempo que une as pessoas no mundo, destruindo as fronteiras geográficas, raciais e de classes, coloca-as num ambiente conflitante, contraditório.
As pessoas que se encontram nesse ambiente sentem-se como se fossem as primeiras, e quiçá as últimas, a experimentarem esse tipo sensação. Isso ocorre há mais de quinhentos anos, e por que ainda os indivíduos assim se sentem? Talvez seria porque a maioria de nós é incapaz de encarar o novo como sendo algo natural. Deixamo-nos levar por nosso medo do futuro, pensando ser ele algo que vai destruir nossas tradições, nossos saberes etc.
Essa complexa modernidade é nutrida por vários acontecimentos, entre os quais temos: a industrialização da produção, a qual ao mesmo tempo que aumenta significativamente a produção, diminui drasticamente o número de empregos; a explosão demográfica, que colabora para a miséria de milhares de pessoas; os grandes sistemas de comunicação de massa, que empacotam num mesmo embrulho os diversos tipos indivíduos etc.
Agora, tracemos a concepção de Miguel Reale sobre a modernidade. Esse eminente jurista a vê com olhos de otimismo, se cotejado com Berman, que acabamos de analisar. Para ele, a modernidade possui uma trajetória linear, é vista apenas como um progresso para a humanidade, anunciando um homem novo, que abandona o individualismo oitocentista e acata o social tão em alta. Abstrai-se dos problemas que a acompanham, e nisso Reale não consegue enxergar a crise jurídica oriunda desses conflitos da sociedade moderna. De modo objetivo, ele vê a modernidade como um corte no direito, porém isso não constitui um problema insolúvel, pois as respostas aos conflitos promanados dessa modernidade encontram-se no próprio sistema jurídico, nas normas jurídicas.
A norma jurídica, por sua vez, segundo Tércio Sampaio Júnior, apresenta-se como uma noção integradora, que determina o campo de atuação e o objeto de estudo da Ciência do Direito. Sob a ótica da Dogmática Jurídica essa definição simboliza um ponto crítico de onde se visualiza as limitações do pensamento científico-jurídico.
Não existe um conceito uno de norma jurídica, mas vários. Isso se deve porque está implícita a subjetividade de quem conceitua. A visão do mundo, do Estado, da realidade, do Direito, tudo isso é relativo. Tércio cita um conceito de norma jurídica que, em seu dizer, já está desgastado e ainda assim prossegue no tempo na consciência do jurista: “... a norma é uma regra, conforme a qual nos devemos guiar...”( von Jhering, “Der Zweck im Recht”).
Sendo uma regra, não pode ser transgredida, pois como o próprio autor diz “...devemos nos guiar...”. Ele não fala em pode guiar, e sim que devemos nos conduzir de acordo com ela, acentuando, de certa forma, o caráter coercitivo na norma jurídica.
Divergindo um pouco de von Jhering, Émile Durkheim diz que o social é coercitivo, o direito é símbolo da solidariedade social. A distinção entre direito público e direito privado apresenta somente uma finalidade prática, distinguindo apenas o direito não privilegiado do direito privilegiado do Estado.
Durkheim distingue dois tipos de solidariedade: a solidariedade mecânica e a solidariedade orgânica. Aquela caracteriza a sociedade segmentária, na qual o direito se faz acompanhar de sanções repressivas (direito penal). A segunda caracteriza a sociedade diferenciada, em que junto ao direito vêm as sanções restitutivas, corrigindo o ato desviado ou anulando seus efeitos.
Para melhor compreensão, tem-se o seguinte quadro sintético da teia das relações sociedade-solidariedade-direito.


Formas de sociedade Tipos sociais Sociedade Direito Sanção Objetivo da sanção

Mecânica semelhantes Segmentária Penal Repressiva Reprovação,
censura,
corporal
punição

Orgânica Dessemelhantes Diferenciada Contratual Restitutiva
restauração
restabelecimento
relações perturbadas

Já Max Weber identifica três bases do Direito: costumes, carisma e lei. Dentro da regularidade da conduta social podemos descobrir usos e costumes. Os usos quando gozam de muita eficácia tornam-se costumes. A dedicação ao líder e a confiança nele, pelas suas qualidades, garantiram e solidificaram-lhe a autoridade. A crença na autoridade de normas estabelecidas de modo racional criou condições para a cristalização do poder e a garantia de obediência.
O direito não é espontâneo, mas construído pelos juristas. A fundamentação e a sistematização do direito, para Weber, está na formação do jurista e na orientação do pensamento jurídico.
Por outro lado, Roscoe Pound, atribui ao jurista o papel de assegurar a satisfação dos interesses sociais, promovendo a harmonia e o equilíbrio entre eles. A ciência jurídica é interpretada teleologicamente. Ele distinguiu a justiça sem lei, sem regras determinadas, baseada na vontade e liberdade de discernimento do indivíduo, e a justiça com lei, com preceitos de aplicação geral, fundamentados no pressuposto de igualdade e infalibilidade possíveis, persistindo o direito como razão e não como vontade arbitrária.
O direito é antes de tudo o produto de forças econômicas, esse é o pensamento de Karl Marx Frederich Engels. O direito é apenas uma superestrutura fundamentada nas condições econômicas. Tem sido estabelecido, desde o início da humanidade pela classe economicamente mais forte. A lei é um instrumento da classe dominante para manter-se no poder e conservar submissas as classes oprimidas. Por isso não leva ao bem comum da sociedade como um todo e sim daqueles que estão no poder. Marx e Engels não vêem o direito como o solucionador dos conflitos sociais, e sim como forma de garantir a dominação dos mais pobres pelos mais ricos.
Contrariamente a Marx e Engels, Georges Gurvitch diz que o “direito representa uma tentativa para realizar, numa dada ambiência social, a idéia de justiça (que é, preliminar e essencialmente, a reconciliação e a variável dos valores espirituais em conflito, assimilados a certa estrutura social), através de um normativismo multilateral imperativo-atributivo baseado em laço determinado entre deveres e direitos; essa regulamentação extrai sua validez dos fatos normativos que dão uma garantia social de sua eficácia e podem em certos casos executar suas exigências – por coerção precisa e externa, porém não a pressupõem necessariamente”. Ou seja, para ele o direito busca a justiça, embora possa recorrer à coercitividade para alcançá-la.
O fenômeno jurídico, como fenômeno social que é, constitui um quadro de referências que se modifica, que se renova incessantemente, razão por que as leis padecem de obsolescência. É nessa perspectiva que Gurvich formula as trilhas da Sociologia Jurídica: “a sociologia do direito é parte da sociologia do espírito* humano que estuda a plena realidade social do direito desde suas expressões tangíveis e exteriormente observáveis nas condutas coletivas efetivas (organizações cristalizadas, práticas costumeiras, tradições ou inovações de conduta) e nas bases materiais (a estrutura social e a densidade demográfica das instituições jurídicas).”
( * estudo das expressões do conhecimento e da cultura humana)

A SOCIOLOGIA JURÍDICA DE NIKLAS LUHMANN

Como sabemos, as relações humanas são direta ou indiretamente ligadas ao direito. Sendo um fato social, do direito é impossível se separar. Sem ele, nenhuma sociedade se estrutura de forma duradoura. O social é sempre regido por normas.
É surpreendente o fato de o direito pouco interessar os sociólogos, em virtude do que acima se expôs. Um exemplo disso é o ensino de “Sociologia Jurídica”, que no mais das vezes é exercido não por um sociólogo, mas sim por um jurista.
A sociologia jurídica encontra-se em plano inferior, se cotejada a outros campos de pesquisa sociológica, a exemplo temos a sociologia de família, a sociologia política etc. Talvez se fosse atividade de juristas, ela conseguiria desenvolver-se mais amplamente. Nos dias de hoje, isso ainda continua sendo uma utopia dos juristas, os quais desejam um auxílio nas elaborações e fundamentações das sentenças.
Um dos problemas enfrentados pelos sociólogos é o grau de complexidade conceitual a que chegou a Ciência Jurídica. Sem árduos estudos sobre o direito, não é possível compreendê-lo. Sendo assim, como avaliar um ato jurídico, em que um dos participantes exerceu a coação?, por exemplo. Como um sociólogo analisaria esse acontecimento social, se não souber o significado de “coação” na relação jurídica? Mais ainda é detectar se um juiz está sendo influenciado em suas sentenças pelo meio social em que vive.
O direito insere-se em todas a áreas da atividade humana, sendo, pois, empiricamente, dela inseparável. Para investigá-lo minuciosamente, teríamos de ter uma sociologia do direito não só que dominasse todo o complexo conjuntos de conceitos jurídicos como também abrangesse toda a área de atuação da sociologia, e que servisse ainda como fonte de informações sociológicas para os juristas. Usualmente, isso é impossível. As sociologias especiais, que outrora foram citadas, possuem um campo de atuação bem definido e por isso elas obtém sucesso.
Quando a área a ser pesquisada não proporciona critérios óbvios de delimitação, as sociologias especiais se vêem obrigadas a tornar-se teoria sociológica geral ou desaparecer. Um exemplo disso foi a sociologia de conhecimento, ao tentar tematizar o norte cognitivo numa sociologia especial. Idem acontece com a sociologia jurídica na proporção em que tenta fazer da orientação normativa geral o assunto de uma sociologia especial.
Em tempos hodiernos, percebe-se uma tendência em desviar-se desses óbices de forma ímpar. É exigido da sociologia jurídica uma referência específica ao direito. Bom é lembrar que nem todos os fatos jurídicos são interessantes à sociologia do direito. Justamente por isso é que deveria deter-se ao conjunto de papéis em particular centrados e relacionados ao tema jurídico, como opiniões sobre sentenças proferidas, questões de legitimidade etc. Dessa forma, o direito é retirado de sua totalidade, de seu rebuscamento, de sua função social, de seu caráter onipresente, e ao qual se pode recorrer enquanto possibilidade. Assim, o direito some da sociologia jurídica. E nessa órbita, várias possibilidades se apresentam, das quais umas se desenvolvem como pontos fundamentais de uma nova sociologia do direito direcionada à pesquisa empírica.
Uma solução é deslocar a visão do direito para o jurista. Dessa maneira o sociólogo investiga um caminho que lhe é conhecido. Tendo por base um conceito central da sociologia moderna, ele pode investigar o papel do jurista. Nesse campo, vai encontrar vários aspectos, como papel de juiz, de advogado, de promotor etc. Poderia chamar a atenção a combinação desses papéis, sua consistência profissional, e minuciosamente, a observação se tais papéis se interceptam de modo a proporcionar uma interação funcional.
Uma segunda solução é o esforço para esclarecer o comportamento de pequenos grupos que executam decisões jurídicas. A técnica e as questões são as mesmas da pesquisa de pequenos grupos. Os colegiados de juízes se apresentam com um experimento natural, como um microssistema bem visível e que age de maneira relativamente isolada, no qual se pode observar, diretamente ou mediante questionários ou entrevistas, o efeito de diversos fatores, como o status social, freqüências de interações, competência na superação de divergências internas de opinião. O objeto principal até agora está direcionado a uma proposição muito limitada do problema: até onde vão as diferenças na estratificação social e os preconceitos ideológicos na influência do processo de decisões judiciárias, ou na sua neutralização em relação ao mesmo. No lugar do conflito justiça versus injustiça, o qual interessa às partes, busca-se verificar qual opinião, embasada em quê, impõe-se na decisão. Isso leva à perda de vista do direito, como também do processo de decisão, da interação e do diálogo jurídico.
Uma outra possibilidade seria desviar o próprio tema de pesquisa do direito para as opiniões acerca do direito, que são obtidas utilizando técnicas da moderna pesquisa de opinião. O objetivo é verificar se há alguma difusão sobre o conhecimento jurídico na população, a respeito de quais atitudes predominantes atinentes ao próprio direito e à organização que cuida do direito, primordialmente a justiça. Nessa direção, seria importante saber se o conhecimento jurídico oscila de acordo com a posição na pirâmide social, se fatores como a idade, o sexo, a educação, a inclusão em certo grupo interferem nas atitudes com relação a determinadas querelas jurídicas, provocando diferenças entre tais atitudes.
O ordenamento jurídico, como o conhecemos hoje, é um edifício complexamente estruturado. Essa complexidade deve ser compreendida, aos olhos de Luhmann, como a totalidade das possibilidades de experiências ou ações, cuja ativação permita o estabelecimento de uma relação de sentido, que no caso do direito significa não só considerar o legalmente permitido, como também as ações legalmente proibidas, quando relacionadas ao direito de modo sensível.
Do exposto, percebe-se que é preciso observar e indagar o direito como estrutura, e como um sistema numa relação interdependentemente mútua a sociedade. Ressaltando que essa relação possui uma configuração temporal, e material, o que leva a uma teoria evolucionista da sociedade e do direito.


LUHMANN: ABORDAGENS CLÁSSICAS À SOCIOLOGIA DO DIREITO

A sociologia jurídica surgiu na metade do século XIX, quando do advento da própria sociologia. Embora pareça tão evidente, não o é. A sociologia dá uma marca diferente ao interesse científico no direito, bem diferente daquilo que a anterior tradição européia havia pensado acerca da relação entre sociedade e direito.
Na transição do Século XVIII ao XIX, a tradição doutrinária européia desmorona, surgindo daí a sociologia. Para aquela, a relação entre direito e sociedade era mais concreta. Assim o direito sempre era tido como um dado, na base das associações humanas. Ele é intrínseco à natureza dessas associações, intimamente ligado a outros caracteres da sociedade, à amizade e à dominação.
O direito natural preparara a interpretação sociológica do direito, em sua última etapa, como direito racional, valendo-se para isso do contrato. O homem é tido como o sujeito e o contrato como categoria mediante a qual o conjunto social da vida humana pode ser analisado como disponível e como contingente, qualquer que seja o seu aspecto.
A sociologia, se cotejada ao direito natural, enxerga a relação entre sociedade e direito como indissociável, mas de maneira abstrata. Pode até admitir a tese de que toda sociedade deve possuir um ordenamento jurídico, porém a tese de que, em função disso, algumas normas seriam igualmente válidas para todas as sociedade é inadmissível.
Para auferir uma noção dos pressupostos do raciocínio, das limitações da sociologia clássica do direito e do seu estilo, interessante é análise sintética da sociologia jurídica sob a ótica de Marx, Maine, Durkheim, Weber, Parsons e Ehrlich.
A teoria marxista vê o direito como produto de forças econômicas. Há contradições sociais resultantes do desenvolvimento da produção e da satisfação de necessidades. O direito simboliza um papel decisivo na instauração de tais contradições, por meio de atribuição particular de chances especiais e desiguais: o direito proporciona e protege a propriedade. Sendo assim, funde as chances de satisfação de necessidades com interesses de família no patrimônio e com competências decisórias em formas de combinações que têm de ser modificadas em função do desenvolvimento das forças produtivas. Dessa forma, se a totalidade do direito está construída ao modelo dos interesses dos proprietários, e por pelos mesmos administrada, então essa modificação do direito só ocorrerá por meio de revolução.
No decorrer do desenvolvimento social seria possível uma socialização da propriedade, a qual afastaria a satisfação das necessidades (distribuição) das decisões na produção (planejamento), trocando o direito objetivado, ligado a interesses (classistas), pela racionalidade.
Já Maine tinha em vista um outro aspecto do mesmo problema, ele caracterizava o desenvolvimento do direito das sociedades antigas como um movimento do status para o contrato. Status e contrato não significam exclusivamente em termos sociológicos, mas diferentes princípios basilares da construção dum ordenamento jurídico e da distribuição de direito e deveres, os quais dever ser observados à luz da estrutura social correspondente.
Émile Durkheim indica, de modo polêmico, as bases não contratuais do contrato. A difusão de ordenamentos contratuais em sociedades diversificadas através da divisão do trabalho não modifica o fato de que o direito , como regra moral, é expressão da solidariedade de uma sociedade. A solidariedade seria condicionada pela diferenciação social e se transformaria paralelamente ao desenvolvimento da sociedade.
Por outro lado, Max Weber visa um desenvolvimento progressivamente diferenciador e automatizador do complexo de normas jurídicas, isto é, liberta do entrosamento com outras estruturas sociais, marcando-as com precisão no interesse de funções específicas. Assim, são ultrapassados elementos do arbítrio pessoal na aplicação do direito e liames a costumes e concepções de moral inerentes a pequenos grupos, tradicionalmente transmitidos, ininteligíveis a estranhos.
Na visão de Talcott Parsons, as posições teóricas de Weber e Durkheim não podiam fazer justiça ao direito, pois o alicerce para uma teoria sociológica autônoma consolidar-se-ia precisamente em torno desse problema. O utilitarismo, em virtude de sua posição de interesse naturalista-individualista, não teria capacidade para resolver o problema de “agregação” de valores sociais. Durkheim contrapôs a isso a tese da realidade objetiva das normas sociais. A compreensão da relação geral entre normas e interesses, provavelmente possibilitadas pela visão materialista da sociedade e pela interpretação gestáltico-ideográfica da história foi contraposta por Weber por uma análise da ação social e tipos ideais formados com base nessa análise.
Em derradeiro, Ehrlich. Ele tinha convicção na insuficiência de uma jurisprudência exclusivamente conceitual que acreditaria ser possível decidir sobre qualquer questão jurídica utilizando-se da dedução lógica a partir de um completo sistema conceitual regulativo.
Ao contrário de outros juristas, como von Jhering, Philipp Hech ou Roscoe Pound, o quais se contentavam com uma ciência do direito sociologizante que ressaltasse os interesses na interpretação das normas, Ehrlich busca, em sua “Fundamentação da sociologia do direito”(1913), fundamentar a ciência do direito no seio da sociologia jurídica. O direito é, para ele, a organização fática do comportamento em corporações sociais, surgindo na vida social, e por isso que a acentuação fixa-se na própria sociedade, nas suas mudanças fáticas. Considerava o direito elaborado pelos juristas em conceitos e preceitos, e o direito posto pelo Estado como um fenômeno secundário, derivado e fracamente verbalizado. Na aplicação do direito dos juristas ou do Estado, ocorrendo dúvidas, recorreria ao direito faticamente vivenciado, ao direito primário da sociedade.
Isso chamou a atenção de juristas, mas não, em especial, de sociólogos. Sociologicamente, é óbvio que o direito é direito na sociedade e com ela se modifica. Daí não se pode ter um ponto de contraposição ao direito dos juristas ou ao direito estatal, que só são compreensíveis no contexto social e nunca externo a ele. O que Ehrlich trata, partindo do ângulo ultrapassado de um desligamento entre sociedade e Estado, é uma diferenciação de papéis e sistemas na sociedade. Mas a sua pesquisa permaneceu insuficiente teoricamente, e o seu conceito de direito, obscuro.
Assim sendo, percebe-se que o direito não é determinado por si mesmo ou a partir de normas ou princípios superiores, e sim por sua referência à sociedade. E essa referência não é tida no sentido tradicional de uma hierarquia de fontes do direito, mas é entendida como uma correlação sujeita a modificações evolutivas, que pode ser experimentalmente verificada como uma relação de causa e efeito.
Isso e outros problemas atinentes às abordagens clássicas da sociologia jurídica levaram Luhmann a afirmar que “...os motivos desse fracasso (o fato de a sociologia do direito não ter tido nenhuma abordagem no sentido de uma teoria sociológica da positividade do direito) da sociologia clássica do direito frente a esse que poderia ter sido seu problema mais importante e atual estão à mão. Eles se localizam-se na insuficiência de suas bases teóricas, no estágio de desenvolvimento da teoria social então disponível. Se ela tivesse formulado o problema da adaptação do direito à crescente complexidade da sociedade, então ela teria podido reconhecer a função e a inevitabilidade da positivação do direito...”


A POSITIVIDADE DO DIREITO SOB O PRISMA DE LUHMANN


Na complexa sociedade atual emergem muitos problemas, em todos os campos, no direito inclusive. Paralelamente a isso, ela apresenta novas formas de possibilidades de resolução desses problemas. A complexidade social cresce em virtude do avanço da diferenciação funcional do sistema social.
Essa diferenciação produz sistemas sociais parciais para a solução de problemas sociais específicos. As proposições de problemas relevantes transformam-se e são obtidas no decorrer do desenvolvimento social, permitindo diferenciações crescentemente abstratas, condicionantes e perigosas em termos estruturais, como por exemplo os sistemas não só de obtenção, mas de distribuição de recursos econômicos, não só para a educação, como também para a pedagogia, não só para a justiça, como para a legislatura etc. A conseqüência disso é uma superprodução de possibilidades que somente parcialmente podem ser realizadas, exigindo mais e mais o recurso a processos de seleção consciente.
Em função dessa explosão de possibilidades da experiência e da ação, é que a contingência do experimentar e do agir na sociedade aumenta.
Em linhas gerais, a diferenciação funcional motiva um crescimento dos problemas e dos conflitos internos na sociedade, e assim, um crescimento dos encargos decisórios em todos os níveis da generalização. Os sistemas parciais ficam gradativamente mais mutuamente dependentes: a política depende do sucesso econômico; a ciência depende de financiamentos e da capacidade de planejamento da política etc.
Os problemas originados da diferenciação funcional transparecem nos diversos institutos do direito, no fato de que noções conhecidas se tornam questionáveis e inseguras. Surgem fissuras nos sistemas dogmáticos. Várias expressões inéditas ainda não conduzidas, como o direito do trabalho, o direito do trânsito, extrapolam o direito vigente e fazem com que decaia sutilmente o nível da arte conceitual e do domínio da matéria no direito. Embora se tenha toda essa valorização da atividade decisória dos juízes, percebe-se que esses problemas não podem mais ser solucionados no plano e na forma dos juristas. À medida em são resolvidos pelo direito, eles exigem progressivamente o recurso à legislação.
O estabelecimento de processos legislativos sendo um componente institucional da vida político-estatal é uma condição imprescindível para reorientação geral do direito em termos de positivação. Foi por isso que a preparação da positivação do direito na órbita conceitual em geral e no plano do conceito jurídico-científico convergiram para o processo legislativo.
Com a instauração do processo legislativo torna-se claro que nem todo direito pode ser cunhado na forma genérica da lei.
Hoje se pode constatar que a positividade do direito não pode ser suficientemente entendida por meio do fato da competência legislativa sobre todo o direito. No desenvolvimento histórico da positivação do direito discorre-se não só sobre a ampliação das atribuições legislativas com respeito a um dado sistema jurídico, como também do desaparecimento da hierarquia das leis, da simples continuidade da lex positiva, depois da perda da crença em fontes superiores do direito. Estritamente se pode falar de positividade do direito somente quando a própria instauração do direito tornou-se base do direito. “O direito positivo vige não porque normas superiores permitem, mas porque sua seletividade preenche a função do estabelecimento de congruência”.
Portanto, a positividade do direito pode ser entendida como a seletividade intensificada do direito. O espaço ampliado do que é realizável enquanto experiência e ação põe o direito natural hipoteticamente não variável à luz de outras possibilidades. O que se “tinha” como constante, ordem no mundo, passa a ser tido como escolha, opção, e como tal tem de ser assumido, independentemente de manter ou não as normas em cada caso. Essa mudança na estrutura torna a decisão o princípio do direito. A positividade desse não se origina da constituição, pelo contrário vige ainda que essa a negue, passando a “exercer-se” como direito natural ou imutável. Por derradeiro, ela provém do desenvolvimento social e está correlacionada com um estrutura social que produz uma grande quantidade de possibilidades mediante a diferenciação funcional, tendendo fazer com que o direito figure-se como contingente.


CONCLUSÃO

A sociedade moderna possui um grande nível de mudança. Isso a leva a caminho repleto de conflitos, confusões, incertezas etc. Em função disso, o direito moderno encontra-se num meio social em que as “soluções” aos problemas promanados daquela parecem não resolver, mas sim criar novos problemas.
A Ciência do Direito enfrenta o problema de o direito não ter uma definição precisa, possibilitando um leque de possibilidades que varia de autor para autor. Isso acontece porque o conceito depende intimamente de quem o elabora, pois aí estão concepções de realidade, de sociedade, do Estado etc., as quais são delimitadas em conformidade com a visão do autor. Talvez, nunca se chegue a uma concepção consensual, como já pensava Kant, pois os tempos mudam, novas correntes de pensamento surgem, a sociedade moderna é dinamicamente mutável etc.
Em virtude da mutabilidade da sociedade, e consequentemente do direito, a Sociologia Jurídica encontra dificuldades para estudá-los. Um dos maiores óbices é a complexidade a que ambos chegaram, combinada com a preterição dos sociólogos, que não se ocupam do direito como fato social, e deixam, muitas vezes, a cargo dos juristas a análise da vida social jurídica.


NOTAS BIBLIOGÁFICAS:

TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. 2.ª edição. Petrópolis:
Vozes, 1995.
CASTRO, Celso A. Pinheiro de. Sociologia do Direito. 5.ª edição. São
Paulo: Atlas, 1998.
LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito I. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1983.
BERMANN, Marshal. Tudo que é Sólido Desmancha no Ar. São Paulo :
Companhia das Letras, 1986.
REALE, Miguel. Nova Fase do Direito Moderno. São Paulo : Saraiva,
1990.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. São Paulo : Memória e
Sociedade. (Traduzido por Fernando Tomaz)

DIREITO - Sociologia e Direito

Sociologia e Direito: duas realidades inseparáveis
Andréa Lucas Sena de Castroadvogada em Natal (RN)

Existe um ramo da Sociologia Geral, denominado de Sociologia Jurídica que tenta perceber a relação existente entre duas ciências de grande importância para a vida da sociedade, por tratarem das relações, dos conflitos, das normas, do controle, enfim, de todas as ligações que possam surgir entre os indivíduos e que necessite de um regulador.
A Sociologia, pode ser descrita como uma ciência positiva que estuda a formação, transformação e desenvolvimento das sociedades humanas e seus fatores, econômicos, culturais, artísticos e religiosos, enfim possui uma vasta acepção. Já o Direito pode ser vislumbrado como uma ciência normativa, que estabelece e sistematiza as regras necessárias para assegurar o equilíbrio das funções do organismo social. Diante disto percebe-se que é de fundamental importância o aprofundamento deste estudo e a percepção que se deve ter do real sentido existente entre a Sociologia e o Direito, como ciências essenciais que o são.
As relações humanas no período helênico eram vistas ou como preceitos religiosos ou como teorias do direito. Por exemplo, pensadores helênicos como Platão, que escreveu "A República" e Aristóteles, que escreveu "A Política", foram os primeiros a sistematizar e a encarar os problemas sociais separadamente da religião, porém, ligando-os à política e à economia. Santo Agostinho, que teve como obra "A cidade de Deus", apresentou idéias e análises básicas para as modernas concepções jurídicas e até sociológicas.
Na Idade Média Européia o cristianismo traçou regras de conduta que deveriam ser obedecidas, por ser este dominante na época. Durante a Renascença surgiram obras que propunham normas entrosadas com a política e a economia. No séc. XVIII, apareceram obras de grande valor no campo da política, economia e sociologia.
Portanto, percebe-se que houve sempre uma tentativa, com relação aos estudos sociológicos, de se analisar as modificações que ocorreram na sociedade, seus conflitos e conseqüências. O objeto da Sociologia é exatamente este, examinar os fenômenos coletivos, através de teorias e métodos próprios. Muitas teorias surgiram para que se tivesse uma visão mais objetiva da sociedade, de sua formação, de sua estrutura, mas, esta sofre mutações todos os dias e necessário se faz que a Sociologia seja bastante dinâmica para acompanhar este processo. Esta ciência, que possui um objeto de estudo tão complexo, engloba em suas análises a relação existente entre a sociedade e as outras ciências, no que diz respeito às influências que estas acarretam para a mesma e as transformações que geralmente ocorrem ao se correlacionarem.
O homem é um ser social por natureza, isto pode ser percebido ao se analisar a sua constituição física, que o leva a relacionar-se com outro ser de sua espécie, para que este possa reproduzir-se, criando assim a base da sociedade, que é a família. A partir desta, ele irá começar a exercitar a sua sociabilidade iniciando suas atividades em grupos sociais maiores, como o do seu bairro, o da escola e etc.
Ao ingressar na sociedade o indivíduo terá que adaptar-se às normas que a mesma impõe. Estas, podem ser de acordo com a moral social ou com a lei, divergindo com relação ao tipo de conduta. O comportamento considerado como um desvio de conduta terá sanções que podem ser repressivas, excludentes e se a infração estiver prevista na lei, estas serão objeto do direito.
Pode-se citar como exemplo um indivíduo que faça parte de um grupo religioso e que venha a trair a sua esposa, o mesmo sofrerá uma sanção de repressão do grupo, uma vez que este grupo social condena essa conduta, podendo o mesmo ser até expulso ou mesmo responder a um processo judicial.
Diante disto, percebe-se que o homem durante toda a sua vida social irá submeter-se a regras, sejam estas impostas por um grupo social ou pelo Estado. Daí surge a ligação entre a Sociologia e o Direito, que é expressa desde a mais simples das relações sociais, podendo ser vislumbrada até mesmo num jogo entre crianças, onde há regras a serem cumpridas para que não haja conflitos. Percebe-se pois, que na sociedade existem vários tipos distintos de grupos sociais e estes caracterizam-se basicamente pelas normas que impõem, e os indivíduos escolhem o grupo do qual queiram participar de acordo com a doutrina de cada um, pois, se o mesmo discorda das regras do grupo este será rapidamente banido. A moral de cada grupo é rigorosamente respeitada, chegando a ter mais força do que a própria lei, inclusive o indivíduo que responde a um processo judicial, seja ele criminal ou não, geralmente sofre discriminação pelo seu grupo social.
A sociedade possui vários modos de conduta coletiva, entre elas, a que mais se destaca são os usos e os costumes. Recaséns distingue os usos dos costumes, estes exercendo uma simples pressão ou uma certa obrigatoriedade, reservando a designação de hábitos sociais para os usos não normativos. Existem várias teorias que tentam diferenciar as diversas normas existentes na sociedade, como o direito, a moral, as normas de trato social, normas técnicas, religiosas, políticas, higiênicas e etc., porém, esta não é uma tarefa das mais fáceis, pois, vários fatores influenciam nesta diferenciação, entre eles a própria convicção de cada grupo.
Para Recaséns a moral tem por sujeito o homem individual, que esta orienta no sentido de sua vida autêntica, já o direito refere-se ao eu socializado, que procura regular no sentido que convenha à convivência humana em dada sociedade. A sociologia do direito fala da moral coletiva como fato social e não da moral individual, em que o indivíduo é o próprio legislador. O objeto da sociologia jurídica de Recaséns é o direito em sua projeção de fato social. A sociologia jurídica é uma ciência generalizadora, ou seja, que procura elaborar leis gerais sobre essa íntima relação entre sociedade e direito, cabendo a esta ciência estudar os processos sociais que levam ao direito e os efeitos que o direito causa na sociedade.
A Sociologia Jurídica surge exatamente para perceber as conseqüências dos tipos de norma de conduta social que são impostas pelos grupos sociais e estudá-las. Pode ser considerada, ainda, como o estudo do direito, este comportando-se como um agente de controle de uma sociedade onde há conflitos entre os que possuem algo e os que nada possuem. A Sociologia Jurídica é uma ciência muito jovem, estando, ainda, numa fase de discursar sobre problemas metodológicos. Para Gurvitch, os pensadores Aristóteles, Hobbes e Spinoza, são os precursores da Sociologia Jurídica, mas é com Montesquieu, Maine e Durkeim que a Sociologia Jurídica, se forma como ciência autônoma. Atualmente a Sociologia Jurídica possui várias barreiras que impedem uma melhor compreensão desta ciência, entre elas pode-se citar o opacidade da linguagem dos códigos e a impenetrabilidade da ciência jurídica, estas levam ao desinteresse por parte dos sociólogos de estudar o direito, portanto necessário se faz que haja algumas mudanças para que se possa abordar melhor a sociologia jurídica.
Pode-se compreender como conceito de Sociologia Jurídica, uma parte da Sociologia que percebe o Direito como fenômeno social, ou sociocultural, estudando os fatores de sua transformação, desenvolvimento e declínio. A Sociologia Jurídica possui como objetivo, ao estudar estes fatores, estabelecer idéias gerais obre a genética do Direito, comparar e indicar as relação existentes entre o direito e as estruturas sócio-culturais, bem como, explicar as bases das idéias e instituições jurídicas.
Portanto, nota-se que a Sociologia Jurídica não se desprende da Sociologia Geral por enfocar, sempre, a conseqüência do direito na sociedade e desta no próprio direito.
A escola sociológica francesa, de Durkeim, aprofundou os seus estudos no fato de ser o direito dependente da realidade social. Montesquieu, no séc. XVIII, já havia, antes desta escola, sustentado tal dependência, chegando a encontrar na natureza das coisas, a fonte última do direito. Portanto, percebeu-se que da natureza do agrupamento social depende a natureza do direito que a reflete e a rege. "Ubi societas, ibi jus": onde houver sociedade haverá direito.
A escola do direito livre, alemã, reconheceu a estreita correspondência entre direito e sociedade. Ehrlich admitia que o direito estatal possuía um papel secundário ao disciplinar a vida social, pois, considerava que o centro da gravidade do direito encontrava-se na sociedade e não no Estado.
Para Gurvitch, existia para cada tipo de sociabilidade um tipo de direito. Essas idéias, contudo, consideravam a vinculação do direito à realidade social e faziam depender do tipo de sociedade o conteúdo do direito.
O direito possui como função primária pacificar os conflitos existentes na sociedade. Para Recaséns esta ciência regula estes interesses conflitantes da seguinte forma:
a) Classificando os interesses opostos em duas categorias, a dos que merecem proteção e a dos que não merecem;
b) Harmonização ou compromisso entre interesses parcialmente opostos;
c) Definindo os limites dentre os quais tais interesses devem ser reconhecidos e protegidos, mediante princípios jurí dicos que são congruentemente aplicados pela autoridade jurisdicional ou administrativa, caso tais princípios não sejam aplicados espontaneamente pelos particulares; d) Estabelecendo e estruturando uma série de órgãos para declarar as normas que servirão como critérios para resolver tais conflitos de interesse, desenvolver e executar as normas, ditar normas individualizadas aplicando as normas gerais aos casos concretos.
Pode-se citar ainda o poder social que refere-se ao mecanismo sociológico da vigência do direito. O legislador irá impor suas vontades, seus interesses, que na verdade são as vontades de senso comum, através das leis e essas serão cumpridas pelo povo que irá decidir se vigorará ou não. Portanto, se a opinião pública pressionar os tribunais, juizes e funcionários administrativos sobre uma norma, mesmo que esta já esteja regulamentada, deverá haver uma revisão para que se atenda às necessidades da população.
De acordo com o pensamento de Philip Selznick, retratado no livro de Cláudio Souto e Joaquim Falcão, a Sociologia do Direito está passando por etapas de desenvolvimento as quais ele classifica em três e considera que esta ciência encontra-se na Segunda delas, são elas;
a) A etapa primitiva, ou missionária, que consistia em comunicar uma perspectiva, isto é, levar uma apreciação de verdades sociológicas fundamentais e gerais a uma área isolada até então;
b) A etapa pertencente ao artesão sociológico, ou seja, era uma época de atividade "braçal", que se caracterizava por uma confiança intelectual em si mesma, um cuidado pelo detalhe e um desejo forte de prestar serviço. Nesta etapa, o sociólogo busca mais que a simples comunicação de uma perspectiva geral, quer explorar a área em profundidade, ajudar a solucionar seus problemas e expor técnicas e idéias especificamente sociológicas;
c) A etapa da verdadeira autonomia intelectual e de maturidade, caracteriza-se quando o sociólogo vai mais além do papel de técnico ou de engenheiro e se consagra aos objetivos e princípios condutores mais amplos da empresa humana particular que elegeu estudar. Reafirma o impulso moral que marcou a primeira etapa de interesse e influência sociológicos.
Destarte, a sociedade pode ser considerada como um conjunto de normas, ou seja, é uma ordem social estabelecida por normas sociais, que são acompanhadas por sanções, para exercer o controle social.
No início da formação das sociedades surgiram necessidades de se condenar àqueles que infringiam alguma regra. Esse sentimento de justiça ou vingança privada podia ser percebido quando um indivíduo que cometia uma infração recebia uma pena proporcional ou maior do que o crime cometido. Esse primeiro instinto, podia ser vislumbrado também diante de linchamentos que ocorriam e isso era bastante negativo para a sociedade e necessitava ser regulado. Foi então surgindo a idéia do Direito positivo. Atualmente, a justiça popular, ou seja, a de "pagar com a mesma moeda", pode ser compreendida, muitas vezes, como uma defesa da sociedade diante da falha da polícia ou dos órgãos de defesa da população. Existe uma grande deficiência no sistema judiciário, seja ela econômica, política ou social e esta crise reflete diretamente na sociedade que já não deposita tanto crédito na justiça, por perceber a lentidão dos processos judiciais, a lotação dos presídios, a falta de recursos para a polícia, enfim uma série de fatores que terminam prejudicando o setor judiciário. Essa decadência é provocada, também, pelo esgotamento do Estado como sociedade politicamente organizada e gerenciadora das atividades públicas e privadas. Isto está ocorrendo também em outros países.
Para Selznick, destaca-se o condicionamento da justiça e do direito por fatores como a mentalidade pragmática, a impaciência com abstrações e os ritmos acelerados das mudanças sociais, ou seja, as sociedades estão evoluindo e com elas surgindo novos conflitos que não estão tendo soluções tão imediatas quanto os mesmos estão necessitando. O setor judiciário precisa de uma reavaliação para melhor atender e solucionar os conflitos do fim do século.
Sociologicamente, pode-se dizer que cada sociedade possui uma noção de direito e justiça e que mediante estes conceitos é que se pode analisar as causas da deficiência do setor judiciário. Muitas vezes o que pode ser considerado como crime grave no Brasil, não o é nos Estados Unidos. Mas ainda, alguns tipos de sociedade acreditam que a justiça está relacionada com a paz social e se não existir um órgão jurisidcional competente que efetive esse sentimento, para esta sociedade, o mesmo tornar-se-á falho. O sociólogo, pois, procura analisar as inter-relações, as qualidades contrastantes, enfim, tudo o que inicie um questionamento sobre o modo de vida coletivo. Ou seja, ele se torna uma ligação entre a sociedade e o conhecimento científico.
A relação entre o direito e a sociologia deve ser sempre vista e analisada como uma reciprocidade, pois, é difícil discursar sobre o ordenamento jurídico sem correlacioná-la com uma realidade social.
Diante do exposto percebeu-se que desde o surgimento da vida em sociedade sempre existiram regras e costumes que disciplinavam a vida dos membros de uma sociedade. A convivência pacífica entre os povos dependia de tratados e acordos que fixavam este relacionamento, o que já pode ser considerado com um avanço do percurso da sociedade ao direito. Portanto, analisou-se que direito e sociedade coexistem, ou seja, não haveria um se o outro não existisse. A sociologia e o Direito são ciências que se completam por estudarem praticamente o mesmo objeto e possuírem idênticos questionamentos.

BIBLIOGRAFIA
LAKATOS, Eva Maria. Sociologia Geral. 5ª ed., São Paulo: Atlas, 1985.
MACHADO NETO, A. L.. Sociologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1987.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
SCURO NETO, Pedro. Manuel de Sociologia Geral e Jurídica: lógica e método do direito, problemas sociais, controle social. São Paulo: Saraiva, 1996.
SOUTO, Claúdio e Joaquim Falcão. Sociologia e Direito, Leituras Básicas de Sociologia Jurídica.

NUTRIÇÃO: A cutura alimentar brasileira

A CULTURA ALIMENTAR BRASILEIRA

por Maria Leonardo, Doutora em Teologia (Etnoteologia e Antropologia Cultural)
Pós-doutorado em Comunicação Intercultural Nome em citações bibliográficas: LEONARDO, Maria.
em http://www.speak.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=39&Itemid=81

RESUMO:
Comer é mais que ingerir um alimento, significa também as relações pessoais, sociais e culturais que estão envolvidas naquele ato. A cultura alimentar brasileira traz em si um “mix” de diferentes culturas em sua formação, tais como a africana, a portuguesa, a européia e a indígena. A alimentação brasileira é mais voltada para o prazer de comer, do que para o valor nutritivo do alimento. Come-se por prazer e não pelo que aquele alimento representa nutricionalmente. Não se dá ênfase ao valor nutricional do alimento, mas ao gosto e prazer da alimentação. Daí a necessidade da formação de um novo conceito alimentar, da inserção de novos valores na cultura alimentar. Trata-se de uma mudança de hábitos, em que o conhecimento da importância das frutas e hortaliças na alimentação, venha direcionar um novo rumo para o consumo destes alimentos e como eles irão aparecer na mesa e no dia-a-dia do povo brasileiro.Palavras-chave: Antropologia da Alimentação; Cultura Alimentar; Frutas; Hortaliças.
ABSTRACT:
Feed is far more than eat any food. It means that there are personal, social and cultural relationships involved in the act of eating. The nutritional Brazilian culture is a mix of different cultures, such the African, European, Portuguese and Ídian. In the Brasilian culture people eat more for the pleasure of eating than towards the nutritional value of the food. Little value is given to the nutritional side of the food. Then there is a need to produce a new culture value concerning the subject.
Keywords: Anthropology; Nutritional Culture; Fruits, Vegetables.


A CULTURA ALIMENTAR BRASILEIRA

A cultura alimentar brasileira traz em si um “mix” de diferentes culturas em sua formação, tais como a africana, a portuguesa, a européia e a indígena. Ao pensar na importância dos frutos e hortaliças na alimentação, é preciso pensar em termos de provocar mudanças de hábitos alimentares.

1.1. Mudança de Hábitos Alimentares
“Toda mudança implica transformação mais ou menos súbita e profunda de certo sistema de equilíbrio, uma fase, pois, de ruptura, até a instauração de novo equilíbrio. Esse processo é acompanhado por um estado de tensão psíquica, por sentimentos vividos muitas vezes confusos, nos quais se misturam ansiedade e certa nostalgia ante a ordem passada, a pressão de uma urgência (...) Todas as nossas mudanças de conduta, da ruptura de um hábito doméstico até as grandes crises políticas, envolvem o conjunto desses aspectos funcionais e emocionais”(Maionneuve,1977).
A massificação da cultura alimentar se aplica na extensão da urbanização onde as pessoas se aglomeram, na industrialização dos produtos alimentares e em seu marketing de oferta, e na mídia imposta na implantação dos produtos ora colocados no mercado como obrigatoriedade de aquisição. Nesse processo de massificação, todos são induzidos a adequarem a nova moda e onda proposta, e todos passam a fazer quase que em osmose o que está sendo proposto.
O poder manipulador de hábitos é outro aspecto importante onde certos hábitos são transmitidos. Certos interesses comerciais de um produto se transformam em poder absoluto quando ocorre indução e coerção à aquisição do mesmo produto. O abalo dos modelos tradicionais de autoridade e poder decorrem na medida em que uma proposta de mudança é feita.
Um trabalho de dinâmica de grupo, pesquisa e formação de opinião irá identificar as fontes de resistência à mudança e os meios de reduzi-las. Quer se trate de hábitos alimentares, ou profissionais, de modos de comando. Se quisermos introduzir uma mudança, precisamos mudar os equilíbrios já estacionários no hábito, num sentido escolhido. Quando há um hábito estacionário já formado, a existência de forças que resistem à mudança são maiores que as forças orientadas para a mudança. Se quisermos introduzir uma mudança, é necessário diminuir as resistências a estas mudanças e aumentar as idéias e pressões em favor da mudança.
A quebra de um hábito dar-se-á mediante uma evolução nas informações transmitidas para que as pessoas façam uma tomada de decisão. Para que isto ocorra, é necessário o descobrimento de uma nova direção, a fixação de objetivo estimulante e a construção de programa coerente para atingi-la.Definição de hábitos alimentares: “Tipos de escolha e consumo de alimentos por um indivíduo, ou grupo, em resposta a influências fisiológicas, psicológicas, culturais e sociais”( Dutra, 2001).
A alimentação brasileira é mais voltada para o prazer de comer, do que para o valor nutritivo do alimento. Come-se por prazer e não pelo que aquele alimento representa nutricionalmente. Não se dá ênfase ao valor nutricional do alimento, mas ao gosto e prazer da alimentação. Em síntese a comida brasileira, a comida do povo, se concentra em massas, gorduras, açúcares e carne. Na cultura alimentar brasileira não há lugar de destaque para as frutas e hortaliças. O prazer alimentar está centrado nesta mistura de massas, gorduras, doces e carnes. Daí a proposta de um redirecionamento alimentar, de uma mudança na cultura alimentar, de uma educação nos valores e hábitos alimentares do povo brasileiro.

1.2. A Cultura Alimentar
Comer é mais que ingerir um alimento, significa também as relações pessoais, sociais e culturais que estão envolvidas naquele ato. A cultura alimentar está diretamente ligada com a manifestação desta pessoa na sociedade.Alimento é um dos requerimentos básicos para a existência de um povo, e a aquisição desta comida desempenha um papel importante na formação de qualquer cultura. Os métodos de procurar e processar estes alimentos estão intimamente ligados à expressão cultural e social de um povo.A Antropologia Ecológica traça os parâmetros da Produção de Subsistência para a produção industrial, e vemos esta evolução em três estágios:
1) As sociedades primitivas sobreviviam da caça, pesca e colheita natural, ou seja, do que pescavam, caçavam e das raízes e frutos que colhiam naturalmente, sem plantações e esforços para produzir. Este representa um nível de subsistência dependente do que a natureza oferece, e é capaz de sustentar somente uma sociedade bem pequena.
2) Depois surge o segundo estágio, que é praticamente a produção de alimentos onde ocorre uma domesticalização de plantas e animais, passando o homem a ser um produtor e não caçador de alimentos. Este processo de administrar e cultivar as sementes e pastorear rebanhos, que garantissem alimentação durante todo o ano, foi um grande avanço. A agricultura e agropecuária tomaram formas bem expressivas na alimentação de uma sociedade, e esta procurava viver em regiões férteis. Neste estágio, as pessoas viviam em pequenas cidades, da produção de suas próprias terras. A troca e venda local destes bens em sua localidade proporcionava tudo de que precisavam.
3) O terceiro estágio é o da Revolução Urbana e Revolução Industrial, em que há a grande concentração de pessoas nos centros urbanos, ocorrendo assim, a necessidade de produção em grandes escalas de alimentos e inserção da produção industrial.A explosão demográfica implica numa nova era na produção de alimentos. Esta revolução tem acontecido nos últimos 200 anos.A comida é uma expressão cultural distinta que envolve aspectos relacionais e interação social no ato de ingestão de alguns alimentos.
Vejamos alguns exemplos:
Na Espanha, o mastigar a semente de girassol é um atividade social. Ao caminhar pelas ruas, você encontrará um grupo de pessoas conversando e compartilhando as sementes de girassol enquanto passam um bom tempo juntas. Ou na manhã seguinte, você encontrará uma grande quantidade de cascas da sementes deixadas no chão, indicando que ali esteve um grupo de pessoas juntas. É comum, nas lindas tardes de verão, um grande aglomerado de pessoas indo e vindo pelas praças, passeando, conversando e mastigando suas sementes de girassol.
No Paraguai, o momento sociocultural mais expressivo é a hora do Tererê, determinada hora durante o dia em que as pessoas se assentam para ter comunhão uma com as outras. A palavra vem do guarani (Tê = chá, Rerê = circulo, roda). Isto significa o momento em que a roda dos amigos e famílias estão juntos conversando e tomando um chá gelado enquanto conversam.
No sul do Brasil, o Chimarrão é outro fator cultural. O chimarrão é tomado numa roda de amigos em momento de relaxamento, descanso e prosa entre amigos.
Na Itália, uma refeição é um momento de profunda comunhão familiar. Uma refeição na Itália dura até mais de 3 horas, pois este momento é reservado para estarem juntos, e o comer é um fator social. É um grande prazer participar de uma verdadeira e típica refeição italiana.
Na cultura árabe, o momento das refeições é a hora de confraternização da família. As donas de casa gastam muito tempo no preparo da alimentação, fazendo com que a refeição seja o mais saborosa possível. Não é incômodo gastar muito tempo para preparar o melhor e mais saboroso, pois o importante é aquele momento em que a família está em comunhão enquanto se come e aprecia o que foi preparado.
Na cultura ocidental, a ênfase não é no momento social da alimentação, mas se come porque é necessário ao corpo. Tudo é “fast food” (comida rápida), na visão de que não se deve perder tempo no preparo da comida, tudo deve ser preparado rápido e sem perda de tempo pois na verdade a vida lá fora corre depressa, e você tem que comer rapidamente também. Não há um fator de interação social no processo de alimentar, se come para manter o corpo e a saúde. Não há laços de amizade e comunhão neste momento. “Fast food”, é o termo e a mentalidade da vida urbana, retirando das pessoas o valor nutritivo, a saúde integral, e as relações familiares e de amor envolvidos no momento de uma alimentação. Quando a mãe alimenta o seu bebê, ela não dá somente leite e nutrientes, dá também amor e afeto. Em todas as etapas da vida, deverá sempre haver este complemento de amor, carinho e confraternização nas refeições. “Fast food” é o corte da vida social intensa.
Na Bolívia, os trabalhadores na agricultura mastigam a folha da coca, para obter energia e força para o trabalho, substituindo uma deficiente alimentação.

1.3. A alimentação na cultura brasileira.
Roberto DaMatta em seu livro O que faz o brasil, Brasil? mostra nossa expressão cultural na alimentação. “Para nós brasileiros, nem tudo que alimenta é sempre bom ou socialmente aceitável. Do mesmo modo, nem tudo que é alimento é comida. Alimento é tudo aquilo que pode ser ingerido para manter uma pessoa viva; comida é tudo que se come com prazer, de acordo com as regras mais sagradas de comunhão e comensalidade. Em outras palavras, o alimento é como uma grande moldura; mas a comida é o quadro, aquilo que foi valorizado e escolhido dentre os alimentos; aquilo que deve ser visto e saboreado com os olhos e depois com a boca, o nariz, a boa companhia e, finalmente, a barriga (...) O alimento é algo universal e geral. Algo que diz respeito a todos os seres humanos: amigos ou inimigos, gente de perto ou de longe, da rua ou da casa (...) Por outro lado, comida se refere a algo costumeiro e sadio, alguma coisa que ajuda a estabelecer uma identidade, definindo, por isso mesmo, um grupo, classe ou pessoa (...) Temos então o alimento e temos comida. Comida não é apenas uma substância alimentar, mas é também um modo, um estilo e um jeito de alimentar-se (...) A comida vale tanto para indicar uma operação universal – ato de alimentar-se – quanto para definir e marcar identidades pessoais e grupais, estilos regionais e nacionais de ser, fazer, estar e viver” (DaMatta, 1984).
A cultura alimentar no Brasil é algo bem peculiar, sendo que nosso hábito alimentar é formado a partir de três povos distintos:
1)A herança alimentar dos índios : estes viviam exclusivamente da caça, pesca e das raízes colhidas. Conhecemos bem que a natureza do índio é preguiçosa, sem o trabalho de plantar aquilo que deseja colher. Daí uma alimentação mais centrada em raízes, e não na produção de hortaliças e outros vegetais da agricultura. Os produtos bases da alimentação indígena eram: mandioca, inhame, milho verde, batata doce, banana da terra, brotos, preparados numa culinária de fogo de chã, ou seja, assados no fogo acesso ao chão. A agricultura nas cidades do Paraguai (herança dos índios guaranis) é também assim; a plantação de uma roça que produz os cereais e grãos, as galinhas de quintal, e praticamente no quintal da casa há uma “vaca de quintal” para a produção do leite. Não se encontra hortas de quintal no Paraguai. A herança dos índios em nosso hábito alimentar: são os amidos e raízes, alimentos estes, ricos em energia e calorias.
2) A herança alimentar dos africanos: a herança alimentar dos africanos são as comidas misturadas na mesma panela. Saiu-se do hábito de assar, para o cozinhar os ingredientes. O arroz com alguma coisa junto, o amendoim com outra coisa. O “cozido” junto nas panelas vem da culinária escrava africana. Esta culinária, pela criatividade das cozinheiras escravas, melhorou pelo cozimento de todos os produtos que o índio comia. Houve grande uso do fubá, da farinha, da rapadura, da goma, do polvilho. Uma herança baseada nos carboidratos, nos cozidos, nas massas e caldos.Em Minas preparava-se a galinha ou porco com canja, a galinhada. A galinha de angola trazida por africanos, o porco do mato caçado por fazendeiros e o porco doméstico criado com as sobras das casas, deram início a uma comida rica em energia e gorduras. Na Bahia, a riqueza das muquecas, do azeite de dendê, leite de coco, tudo na mesma panela. No Rio de Janeiro, a feijoada.
3) A herança alimentar dos portugueses: a base cultural da comida portuguesa é a oliva. Ainda hoje a comida portuguesa é sobrecarregada de azeite de oliva, ocorrendo, assim, a predominância de gorduras. O cenário de um quintal e lavoura em Portugal é assim: Árvores de Oliva (Oliveiras), parreiras de uvas, e plantação de couve debaixo destas para fazer o famoso “Caldo verde” que é feito de fubá, couve e azeite de oliva. Aqui no Brasil, o óleo de oliva foi substituído inicialmente pela gordura animal e depois por outros óleos.
A herança alimentar portuguesa trouxe os requintes da mesa e o manuseio de melhores pratos. A oliva, a gordura, os pastéis, as massas e os doces. Houve criação de variedades de pratos, o frango com quiabo e outros, o doce de leite, os doces em compotas. Sendo a calda para conservar o doce, e o queijo para quebrar um pouco do doce das compotas. A herança portuguesa em nosso hábito alimentar: alto teor de gordura e açúcar.O europeu e o americano possuem uma alimentação bem definida e separada no prato e não se mistura as coisas. Cada qual no seu canto e bem definido. Mas nossa comida brasileira é a comida da mistura no mesmo prato. Gostamos de tudo junto e misturado. O feijão com arroz, o cozido, a peixada, a feijoada, a muqueca, a farofa, o tropeiro, o carreteiro, o pirão, as dobradinhas e papas, os guisados e mexidos. A herança alimentar destes três povos distintos e a mistura de seus hábitos formaram a deliciosa comida brasileira.
1.4. As frutas e hortaliças na alimentação brasileira
A comida é uma das expressões culturais mais significativas. A comida mexe com a pessoa, fascina seus gostos e desejos. Na cultura alimentar brasileira, a alimentação é mais voltada para o prazer de comer do que para o valor nutritivo do alimento. Comemos por prazer e não pelo que aquele alimento representa nutricionalmente. Não se dá ênfase ao valor nutricional do alimento, mas ao gosto e prazer da alimentação.
A comida brasileira, a comida do povo, se concentra em massas, gorduras, açúcares e carnes. Não há na cultura alimentar brasileira muito espaço para as frutas e hortaliças, visto que nosso prazer alimentar está centrado na mistura de massas, gorduras, doces e carnes. Nosso prazer de comer não está associado à ingestão de frutas e hortaliças. Daí a necessidade da formação de um novo conceito alimentar, da inserção de novos valores na cultura alimentar. Trata-se de uma mudança de hábitos, em que o conhecimento da importância das frutas e hortaliças na alimentação, venha direcionar um novo rumo para o consumo destes alimentos e como eles irão aparecer na mesa e no dia-a-dia do povo brasileiro.
Esta informação e conscientização do valor e importância das frutas e hortaliças devem ser feitas de tal forma que venham a mexer no âmago da cultura brasileira: comer e prazer de comer. Esta noção de prazer, de gosto pela comida, deve interagir no prazer pela saúde e pela vida, levando cada pessoa a reeducar-se: eu gosto desta fruta, eu tenho prazer em comer esta hortaliça, pois ela tem sabor de saúde. Para o brasileiro, as saladas e hortaliças não têm gosto, não têm sabor, não “matam a fome”, e servem tão somente para enfeitar o prato. É preciso atuarmos numa conscientização pelo gosto, pelo sabor, inserindo fatores de mudança cultural que mexem com o fator de adaptação cultural mais difícil para um brasileiro: a comida.

Maria Leonardo, Doutora em Teologia (Etnoteologia e Antropologia Cultural)
Pós-doutorado em Comunicação InterculturalDoutora em Antropologia da ReligãoMestranda em Relações Internacionais, PUC Minas Mestrado em Teologia Prática (Psicologia Social Aplicada às Relações Interpessoais)Bacharel em Teologia, com especialização em MissiologiaBacharel em Química,com especialização em Tecnologia de Alimentos pela Universidade de Itaúna Pós-graduação em Nutrição e Saúde pela Universidade Federal de LavrasPós-graduação em Administração de Empresas e Gestão do Terceiro SetorPós-graduação em Antropologia Cultural e Desenvolvimento SocialPós-graduação em Psicologia SocialÉ reitora da Faculdade Etnia ePresidente da Missão Transcultural EtniaTítulo Honorífico: Doutora em Filosofia Cristã Áreas de Especialização Antropológica:Antropologia Cultural e Etnoteologia, Antropologia da Religião,Antropologia das Relações Internacionais,Antropologia Empresarial e do Terceiro Setor,Antropologia das Relações Interétnicas,Antropologia da Alimentação


Bibliografia.
ANDRADE, Patrícia. Do Mediterrâneo para o Brasil. Revista Saúde. n.207, 2000. p..22-27.
DaMATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? 8 ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1984. p.55-57.
DUTRA-de-Oliveira,J.E., MARCHINI, J.Sérgio. Ciências Nutricionais. 2 ed. São Paulo: Sarvier, 2001. p.364-376, 383.
MAISONNEUVE, Jean. Introdução à Psicossociologia. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1977. p.206.

METODOLOGIA - CIENCIA É COISA BOA Ruben Alves



Ler capitulo Ciencia é coisa boa

METODOLOGIA - Diretrizes para a realização de um seminário

DIRETRIZES PARA A REALIZAÇÃO DE UM SEMINÁRIO


1. OBJETIVOS

O objetivo de um seminário é levar todos os partici­pantes a uma reflexão aprofundada de determinado problema, a partir de textos e em equipe. O seminário é considerado aqui como um método de estudo e atividade didática específica de cursos universitários.
Para alcançar esse objetivo, o seminário deve levar to­dos os participantes:
a um contato íntimo com o texto básico, criando condições para uma análise rigorosa e radical do mesmo;
à compreensão da mensagem central do texto, de seu conteúdo temático;
à interpretação desse conteúdo, ou seja, a uma compreensão da mensagem de uma perspectiva de situação de julgamento e de crítica da mensagem;
à discussão da problemática presente explícita ou implicitamente no texto.

2. O TEXTO-ROTEIRO D1DÁTICO (material a ser apresentado previamente ao professor que estará sempre à disposição da equipe durante o preparo e a apresentação do seminário)

Conteúdo:
§ apresentação da temática do seminário à o tema
§ breve visão de con­junto da unidade à os vários assuntos
§ esquema geral do texto à plano

Plano:
Situação da unidade estudada:
§ na obra do autor
§ no pensamento geral do autor
§ no contexto histórico cultural

Elaboração:
§ dos principais conceitos
§ das idéias e
§ das doutrinas que tenham relevância no texto

Problematização:
§ levantamento das questões importantes
§ discussão das idéias veiculadas pelo texto
§ criação de contextos que provoquem o raciocínio argumentativo dos participantes.

Orientação bibliográfica à bibliografia especializada sobre o assunto.


3. ORIENTAÇÃO PARA A PREPARAÇÃO DO SEMINARIO
Como o seminário é um trabalho essencialmente coletivo, pressupõe empenho de todos e não apenas do grupo responsável pelo encaminhamento dos trabalhos no dia do seminário. Assim sendo, todos os participantes fazem um estudo do texto para poder exercer efetiva participação nos debates do seminário.


Cabe a toda classe:
§ comparar sua compreensão e interpretação do texto com a compreensão e interpretação do grupo que preparou o seminário;
§ levantar problemas temáticos e interpretativos para a discussão geral; e
§ exigir esclarecimentos e explicações do grupo sobre pontos obscuros da apresentação;

O seminário não se reduz a uma aula apre­sentada por uma equipe e comentada pelo professor.
O seminário é um círculo de debates para o qual todos devem estar suficientemente preparados. Por isso, exige-se que todos os participantes estudem o texto com o rigor devido.


4. ESQUEMA GERAL DE DESENVOLVIMENTO DO SEMINÁRIO

4.1. Introdução pelo professor
4.2. Distribuição do roteiro para todos os alunos
4.3. Apresentação pelo coordenador do grupo:
§ das tarefas a serem cumpridas no dia
§ das orientações para a realização do seminário
§ do cronograma das atividades.
4.4. Apresentação do seminário pelo grupo guiando-se pelo roteiro
4.5. Abertura pelo coordenador do grupo da discussão geral
4.6. Síntese final de responsabilidade do professor.


adaptação (p.63 a p.71) da obra de
SEVERINO, A. J.Metodologia do Trabalho Científico. SP: Cortez, 2002.

NUTRIÇÂO - O papel da Carne na evolução humana

O papel da carne na evolução humana
Por Natalia Cuminale Marina Dias 12 de agosto de 2009


Entre as razões para defender o fim da ingestão de carnes, os vegetarianos apresentam uma apoiada na história de nossa espécie: o consumo desse item não é mais vital ao ser humano, como foi para nossos ancestrais. Não estão errados ao apresentar esse argumento. Cabe lembrar, contudo, que a carne de fato teve papel fundamental na evolução
O consumo dos produtos de origem animal pode ter contribuído para o crescimento acelerado da massa cerebral humana, devido à grande quantidade de nutrientes e proteínas encontrada ali, explica Rui Murrieta, professor de antropologia do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP). A dieta dos antigos não era exclusivamente carnívora: a alimentação era mais parecida com a dos grandes macacos, que comiam frutas, tubérculos e sementes. "A carne era um complemento à alimentação diária, obtida por meio da rapinagem (apropriação da caça de outros predadores) ou da caça de pequenos animais", diz.
Murrieta explica que a carne não é mais indispensável à espécie porque, atualmente, podemos obter uma alimentação rica em proteína a partir de outras fontes. "Nossos ancestrais distantes não sabiam plantar, não tinham conhecimento e nem recursos para obter proteína e nutrientes necessários: até 10.000 ou 12.000 anos atrás, antes da revolução agrícola, éramos caçadores e coletores", conta o professor.
O homem possui um sistema digestivo onívoro - um modelo que se localiza entre o do leão e o da vaca, em termos evolutivos -, capaz de digerir a carne com muita eficiência. Por outro lado, ele é capaz de se adaptar facilmente a uma dieta vegetariana.
Prazeres da carne - Não é possível precisar o momento exato em que o homem passou a ingerir carne, diz a antropologia. Porém, é provável que nossos ancestrais tenham começado a consumir o produto há pelo menos dois milhões de anos. As ferramentas usadas na época, descobertas por escavações arqueológicas, deixam claro que era possível esmagar ossos e aproveitar o tutano - substância de alta concentração de gordura encontrada dentro dos ossos e rica em nutrientes.
"Mesmo sem esse tipo de ferramenta, é possível que nossos ancestrais já tivessem carne em suas dietas há 4 ou 5 milhões de anos", afirma Murrieta. "Os babuínos, por exemplo, caçavam sem uso de pedra. A ferramenta seria utilizada para esmagar os ossos e consumir o tutano, mas não precisava ser necessariamente lascada", relata. Outra informação importante que vem do passado e sugere que a carne fazia parte do prato na Pré-história: nossos ancestrais possuíam muito mais força no aparato dentário, o que facilitava a mordida e não exigia necessariamente o corte.

ÈTICA- A ètica do dia-a-dia

A ética do dia-a-dia Entrevista: Peter Singer


O filósofo australiano diz que quando pessoasnormais cometem crimes bárbaros é sinal deque a sociedade perdeu o controle de si própria Gabriela Carelli


Richard Perry/The New York Times

"Num primeiro momento, pequenas infrações parecem não ter importância, mas ao longo do tempo a moral da comunidade é afetada em todas as esferas"

O filósofo australiano Peter Singer, de 60 anos, especialista em ética, tornou-se mundialmente conhecido com o livro Libertação Animal, de 1975, no qual defendia que nada justifica os maus-tratos impostos aos animais pelos produtores de alimentos. Com mais de trinta outras obras publicadas desde então, Singer agora volta ao assunto em seu novo livro, A Ética da Alimentação, recém-lançado no Brasil. Nele, defende que a forma como o ser humano se alimenta hoje precisa ser reavaliada, pois tem enorme impacto não apenas no sofrimento dos animais, mas também na saúde das populações. Ao longo de sua vasta obra, Singer, hoje professor da Universidade Princeton, nos Estados Unidos, trata de assuntos como aborto, uso de embriões para pesquisas científicas, eutanásia e pena de morte.
Nesta entrevista a VEJA, o filósofo comenta o assassinato brutal do menino João Hélio Vieites, de 6 anos, e destaca a necessidade de exercitar a ética diariamente para manter os valores morais de uma sociedade.

Veja – O assassinato do menino João Hélio, de 6 anos, há duas semanas, chocou o Brasil e reacendeu o debate sobre os valores éticos na sociedade brasileira. Um crime bárbaro pode ser tomado como medida dos valores morais de uma nação?
Singer – Crimes como esse se sobrepõem à imoralidade. São amorais. Essa ausência total de valores morais é geralmente percebida em atos praticados por psicopatas ou assassinos em série. Quando pessoas supostamente normais cometem barbáries como essa, tem-se um péssimo sinal. É uma prova de que a sociedade em questão perdeu o controle de si mesma, que as pessoas não têm mais a noção exata de certo e errado. Eu não conheço o Brasil e não sou criminalista, por isso não posso falar de forma específica sobre o caso. De qualquer modo, como os jovens assassinos tinham a opção de parar o carro e evitar a tragédia, o ato torna-se injustificável sob qualquer ponto de vista.

Veja – Existem valores éticos inatos ou todos resultam da vivência e do aprendizado?
Singer – Certos aspectos morais são inatos, como o respeito e o compromisso com a família, com os filhos e com os pais, assim como o senso de justiça e a reciprocidade. São valores universais, presentes em todas as sociedades. Já foi provado que eles existem também entre macacos, gorilas e chimpanzés. Mas alguns valores morais podem sofrer transformações de acordo com os traços culturais e com a realidade de cada sociedade. Essa influência da cultura e da realidade nos valores morais pode ser bem percebida quando tratamos de assuntos como aborto, eutanásia e comportamento sexual. Cada país tem uma visão diferente dessas questões.

Veja – O que pode causar o enfraquecimento dos valores éticos numa sociedade?
Singer – A ética é um exercício diário, precisa ser praticada no cotidiano. Só assim ela pode se afirmar em sua plenitude numa sociedade. Se uma pessoa não respeita o próximo, não cumpre as leis da convivência, não paga seus impostos ou não obedece às leis de trânsito, ela não é ética. Num primeiro momento, pequenas infrações isoladas parecem não ter importância. Mas, ao longo do tempo, a moral da comunidade é afetada em todas as suas esferas. Chamo a isso de círculo ético. Uma ação interfere na outra, e os valores morais perdem força, vão se diluindo. Para uma sociedade ser justa, o círculo ético é essencial.

Veja – Essa lógica pode ser aplicada a questões que envolvem criminalidade?
Singer – Sem dúvida. Bogotá é um exemplo desse círculo ético aplicado no combate à violência. Na capital colombiana, diminuiu-se a criminalidade combatendo-se os pequenos crimes diários. Foi um sucesso. Quando os cidadãos são estimulados a respeitar as leis básicas, passam a respeitar a si próprios, ao próximo e à cidadania. É o primeiro passo para mudar uma sociedade corrompida.

Veja – O senhor é a favor da pena de morte?
Singer – Definitivamente, não. A pena de morte não é moralmente aceitável e brutaliza uma sociedade. Prefiro a pena de prisão perpétua, que é mais justa.
Veja – O senhor defende o aborto e a eutanásia, mas não a pena de morte. Não é uma contradição? Singer – Não. Tanto o aborto quanto a eutanásia não provocam sofrimento. Ao contrário. São práticas que aliviam o sofrimento. Considero o feto uma vida humana, mas não uma vida que tenha sensações e sentimentos, pelo menos na fase de gestação em que ocorre a maioria dos abortos. A eutanásia é a alternativa moral para aliviar o sofrimento de doentes terminais. Minha posição é contra a interrupção da vida de um ser, seja humano, seja animal, que deseja continuar a viver e sofrerá com a morte inesperada.

Veja – Em seu último livro, o senhor volta ao tema dos direitos dos animais. Não é contraditório justificar o aborto e a eutanásia mas defender a vida dos bichos?
Singer – Sempre fui mal interpretado nesse aspecto. Em nenhum momento disse que não devemos comer carne porque é errado matar animais. O alvo de minhas críticas é a maneira antiética como os animais são criados e abatidos para consumo.

Veja – O senhor argumenta que é preciso pensar na comida de forma ética. O que significa isso? Singer – As pessoas precisam parar de pensar na comida apenas como algo de que se gosta ou que faz bem à saúde. O ato de comer também é uma decisão ética e moral. É necessário pensar nas conseqüências do comer, tanto para os animais que nos servem de alimento como para o meio ambiente ou para nós próprios. A forma como nos alimentamos hoje faz o animal sofrer, provoca uma epidemia de obesidade no mundo e é causa de uma série de doenças nos seres humanos. Isso tem impacto profundo no planeta e no meio ambiente.

Veja – O que há de errado na criação dos animais destinados à alimentação humana?
Singer – Os animais são criados nas fazendas industriais sem a mínima dignidade. Os porcos, que instintivamente procuram abrigo para alimentar seus filhotes, não podem sequer se mexer, porque vivem num espaço mínimo. Os filhotes são arrancados da mãe o mais rápido possível, para que possam engordar e procriar. O gado não come capim, como todo mundo pensa, mas restos de animais e seus excrementos. Os frangos criados em granja vivem em galpões que abrigam até 20.000 aves que nunca vêem a luz do dia, só a luz artificial. São abarrotadas de antibióticos e hormônios para ganhar peso. Quem não se interessa pelos bichos deve pelo menos pensar em si próprio. A doença da vaca louca é um exemplo do resultado dessa forma de criação estapafúrdia. Além disso, o confinamento de bilhões de animais, alimentados de forma excessiva para o abate, exige uma quantidade incomensurável de plantações. Em alguns anos não haverá mais terra para plantio no planeta. Isso sem falar que a China e a Índia, com suas enormes populações, começaram a reproduzir métodos ocidentais de criação de animais. Se esse processo continuar, aumentarão os danos ao ambiente, a incidência de doenças cardíacas e os casos de câncer do sistema digestivo. São bons motivos para avaliar a comida moralmente.

Veja – O que o senhor propõe para mudar essa situação?
Singer – Eu sou vegetariano, mas não acredito que parar de comer carne seja a solução para o mundo. Há maneiras mais dignas de criar os animais, respeitando sua natureza e o meio ambiente. Pode parecer contraditório, mas são os próprios produtores de alimentos que vão imprimir essas mudanças. Na primeira etapa do processo, o consumidor precisa ser educado. Esse é um dos objetivos do meu novo livro. As pessoas têm de conhecer a realidade das fazendas industriais e saber que suas escolhas têm muito peso para modificar a atitude dos empresários do ramo em relação aos animais. O mercado só produz o que o consumidor quer. O consumo de vitela, por exemplo, caiu drasticamente quando se tornou público que os bezerros são separados da mãe e transformados propositalmente em animais anêmicos, confinados em espaços minúsculos, para que sua carne fique macia e branca.

Veja – Os produtores de alimentos estão dispostos a mudar seus métodos de criação de animais de maneira drástica?
Singer – Eles não têm muita saída. No mês passado, o maior produtor de porcos dos Estados Unidos, a Smithfield Farms, anunciou uma reestruturação nos criadouros de seus animais, hoje confinados em pequenos espaços. A empresa tem 187 fazendas de porcos nos Estados Unidos e prevê que só em dez anos as mudanças serão implementadas em todas elas. Mas a simples divulgação da medida já desencadeou uma série de outras ações, inclusive de empresas menores, que conseguirão resultados mais rapidamente. Poucos dias depois de a empresa americana anunciar isso, a maior produtora canadense de porcos decidiu fazer o mesmo.

Veja – A ação dessa empresa decorre da conscientização do consumidor?
Singer – Sem dúvida. É uma reação em cadeia. A empresa americana só promoveu mudanças em sua criação de porcos porque sofreu pressão de um de seus maiores clientes, o McDonald's. E isso só aconteceu porque os clientes do McDonald's mostraram indignação com a forma como os porcos são criados. O mesmo está ocorrendo em relação ao aquecimento global. A preocupação das pessoas com o futuro do planeta é cada vez maior, o que tem pressionado as empresas a mudar suas atitudes e seus métodos de produção, criando alternativas para evitar a emissão de dióxido de carbono.

Veja – A humanidade sempre manteve laços afetivos com alguns animais. Por que oferecemos tanto amor aos bichos de estimação e às espécies em extinção enquanto negligenciamos as que nos alimentam?
Singer – Sempre fomos muito seletivos em relação aos animais com os quais queremos nos relacionar. Temos uma ligação mais profunda com bichos nos quais reconhecemos emoções e sentimentos, em particular com os cachorros, por causa do amor incondicional que eles nos oferecem. Respondemos bem a isso. As espécies em extinção, por sua vez, representam as mudanças que o planeta sofreu por causa da interferência humana. A extinção, por ser irreversível, é uma representação da perda, um processo que nos toca fundo. O mesmo não acontece com os animais que nos servem de alimento. O ser humano não tem empatia com eles nem quer mudar os próprios hábitos alimentares. É mais fácil não pensar sobre isso.

Veja – Em seu livro, escrevendo sobre a obesidade, o senhor sugere uma reflexão sobre o conceito da gula. Por que a sugestão?
Singer – Comemos demais e desnecessariamente. As religiões, de certa forma, sempre exerceram um controle sobre o que os fiéis comem. Uma leitura moral da história da alimentação revela que, de todas as religiões, a que menos conteve os excessos alimentares foi o cristianismo. Não se encontra na cultura cristã a série de restrições alimentares presente no islamismo, no judaísmo e até mesmo na tradição hinduísta. Nessas três culturas, há diversas advertências sobre o que se deve ou não comer. O que existe na tradição cristã é o pecado pelo excesso de comida, a gula, que foi esquecido ao longo dos séculos pelos cristãos. Esqueceram-se da gula e preocuparam-se com outros pecados, principalmente os de natureza sexual. O maior exemplo disso são os Estados Unidos. É um país cristão por natureza e, mesmo assim, a nação com a maior população obesa do mundo. Precisamos pensar sobre isso. Afinal, uma pessoa que come o dobro ou mais de carne do que precisa, carne proveniente de animais criados para consumo, não faz mal apenas a si mesma. Esse hábito tem impacto no planeta e, do ponto de vista moral, também é duplamente ruim.

Veja – O senhor é a favor dos alimentos geneticamente modificados, os transgênicos?
Singer – Do ponto de vista moral, não vejo mal algum nos transgênicos. Ainda mais imperioso do que combater a obesidade é acabar com a fome no mundo, e esses alimentos podem ser uma das soluções para o problema. Além disso, as plantações de transgênicos não precisam de pesticidas, o que ajuda a preservar o meio ambiente, ao contrário do que ocorre nas fazendas convencionais.
Veja – O que diria a quem deseja ser ético em relação à alimentação diária?
Singer – O que defendo no livro, e faço questão de deixar bem claro, é que não precisamos ser vegetarianos para ser éticos. Da mesma forma que não precisamos parar de usar o carro para ajudar a combater o aquecimento global – podemos mudar o tipo de energia usada para o carro funcionar. Na questão alimentar, é possível, por exemplo, evitar a carne de animais criados de forma tradicional. Uma boa opção é escolher os produtos animais provenientes das chamadas fazendas orgânicas. Já é uma tremenda mudança.

Veja – E que conselhos daria a quem quer ser ético no dia-a-dia?
Singer – Comece pelo mais simples. Cumprimente as pessoas, diga bom-dia, seja educado com quem convive.

METODOLOGIA- Pesquisa em Contabilidade

Pesquisa em Contabildade
A qualidade da pesquisa contábil no Brasil está na agenda atual das Ciências Contábeis. Percebendo o avanço quantitativo de trabalhos na área, especialistas buscam traçar agora diretrizes de qualidade para o setor.
A temática é tratada pela Revista Brasileira de Contabilidade em sua edição de janeiro/fevereiro (nº 169), em reportagem que entrevistou experts da área, gestores de programas de pós-graduação em conceituadas instituições.
O diagnóstico apresentado pelos especialistas é de que a pesquisa contábil vem conhecendo um avanço sensível nos últimos anos em termos de produção, mas que existem pontos falhos dos estudos na área desenvolvidos nos programas de pós-graduação que precisam ser enfrentados.Na matéria, os pesquisadores elencam quais são estes pontos fracos, os chamados "10 pecados" da pesquisa contábil:"
1. O tema do estudo não ser, ao mesmo tempo, importante, viável e original;
2. Não-realização de um inventário de estudos anteriores sobre o tema;
3. Inadequações na elaboração do problema de pesquisa;
4. Estudos que não são 'nem abrangentes', 'nem aprofundados';
5. Fraqueza na sustentação da plataforma teórica do estudo;
6. Uso inadequado das fontes consultadas para desenvolvimento do estudo;
7. Pouca atenção para com os aspectos de confiabilidade e validação;
8. Crença na auto-explicação dos testes estatísticos;
9. Deficiências na enunciação das conclusões de estudo;
10. Pouca diversidade no emprego de concepções teóricas, abordagens metodológicas, técnicas de coleta de dados, informações e evidências." (RBC, jan./fev. 2008, p. 14)
Os pontos arrolados pelos especialistas evidenciam preocupações que devem estar presentes em todas as ciências sociais aplicadas, e não só na Contabilidade. Mas, se tais problemas vêm ocorrendo de forma mais sistemática neste campo, talvez se deva à condição não tão consolidada da pesquisa em Contabilidade no Brasil.
Os programas de pós-graduação são relativamente novos, o número de pesquisadores com titulação na área é pequeno. A ciência contábil precisa, ainda, encontrar seu caminho.Fica evidente, diante dos pontos trazidos pela RBC, a necessidade de que os cursos de graduação enfatizem a formação metodológica de seus alunos.
Estes serão os pesquisadores no futuro. Para que isso ocorra, é preciso estimular a iniciação científica, tornar a produção científica uma realidade na sala de aula.Se faz necessário, para tanto, eliminar a dicotomia entre teoria e prática, como se as duas esferas não fossem integrantes da mesma realidade. E isso só será conseguido quando o ensino em sala de aula aliar as duas dimensões na figura do professor: a docência e a pesquisa. Requer-se aqui uma habilidade do docente não só em transmitir ao aluno os conhecimentos necessários a sua atuação no mercado de trabalho, mas também em socializar o estudante no campo da investigação científica.Neste diapasão, a disciplina de metodologia científica tem um papel muito importante, que é o de sistematizar as práticas de investigação em ciências sociais aplicadas, em pensar o método científico, em formular estratégias no âmbito da investigação. No entanto, tal disciplina não deve ser entendida no curso como um apêndice. Daí, a necessidade dos cursos de ciências sociais aplicadas estimularem a inter e transdisciplinaridade.
A responsabilidade pela qualidade da pesquisa em ciências contábeis não compete apenas aos cursos de pós-graduação. Esta é minha leitura diante dos dados apresentados pela RBC. Todos nós envolvidos com ensino nos cursos de contabilidade precisamos mobilizar esforços nesta direção. Ensino de graduação só se faz bem quando articulado à pesquisa.

METODOLOGIA - Conhecimento cientifico x Conhecimento Popular

Conhecimento Cientifico x Conhecimento Popular

Quando tratam dos diferentes tipos de conhecimento, os manuais de metodologia, ciência ou filosofia geralmente opõem o conhecimento científico às formas de conhecimento popular, numa dicotomia aparentemente insuperável.
Há justificáveis razões para isso, afinal o conhecimento científico é sistemático, factual e aproximadamente exato, enquanto o saber popular é qualificado como subjetivo, assistemático, valorativo e inexato.
A ruptura entre conhecimento popular e científico (ou erudito e popular) em nossa cultura é uma herança da revolução científica no Ocidente, desde Copérnico, passando pelo pensamento inaugurador da modernidade, o Iluminismo. Mesmo na pós-modernidade, quando se relativizam as certezas e a própria noção de verdade, a ciência não perde seu papel central na cultura, atestando o saber que pode ser reconhecido como válido ou legítimo.
No entanto, embora possamos apontar diferenças entre as duas formas de saber, é preciso reconhecer que o primado do científico em detrimento do popular é produto de um auto-centrismo cultural, que invalida todo saber produzido fora dos ambientes legítimos.
Dois exemplos, em dois ambientes diferentes: a sala de aula e o consultório médico. No consultório, frequentemente se percebe o embate entre os saberes populares (trazidos pelo paciente, sobretudo de camadas menos abastadas da sociedade, com suas etiologias e receitas próprias para cura) e científico (materializado pelo médico, detentor de um conhecimento legítimo que o autoriza a diagnosticar e tratar). Na sala de aula, o professor também é detentor de um conhecimento legítimo (domina um código particular, a linguagem escrita, e também formas de saber-fazer) que se confronta com o saber do aluno, oriundo de sua própria experiência, visão de mundo e cultura.
Felizmente, hoje, as diversas áreas "canônicas" de saber (como educação e saúde) têm procurado reintegrar os saberes populares, vendo-os como diferentes, mas não necessariamente opostos. A área farmacêutica tem aprendido muito, para dar um exemplo, com os conhecimentos tradicionais dos povos ameríndios. Da mesma forma, a educação tem ampliado seu olhar para incorporar o diferente e perceber que não há uma só "metodologia" possível.

METODOLOGIA: Espirito Cientifico

Espírito Científico "Francisco Saiz"
La ciencia reconoce problemas eternos, pero rechaza las respuestas eternas" (Margenau)

O homem é um ser que faz questionamentos existenciais, e que tem que interpretar a si e ao mundo em que vive, atribuindo-lhes significados. Cria representações significativas da realidade, as quais chamamos conhecimento.
O conhecimento, dependendo da forma pela qual se chega a essa representação, pode ser classificado em diversos tipos como, por exemplo, mítico, ordinário, dogmático e científico.
O conhecimento científico é o que é produzido pela investigação científica, através de seus métodos. Surge não apenas da necessidade de encontrar soluções para problemas de ordem prática da vida diária, mas do desejo de fornecer explicações sistemáticas que possam ser testadas e criticadas através de provas empíricas.
A investigação científica se inicia quando se descobre que os conhecimentos existentes, originários quer do senso comum, quer do corpo de conhecimentos existentes na ciência, são insuficientes para explicar os problemas surgidos. O conhecimento prévio que nos lança a um problema pode ser tanto do conhecimento ordinário quanto do científico.
Quando o homem sai de uma posição meramente passiva, de testemunha dos fenômenos, sem poder de ação ou controle dos mesmos, para uma atitude racionalista e lógica, que busca entender o mundo através de questionamentos, é que surge a necessidade de se propor um conjunto de métodos que funcionem como uma ferramenta adequada para essa investigação e compreensão do mundo que o cerca. O homem quer ir além da realidade imediatamente percebida e lançar princípios explicativos que sirvam de base para a organização e classificação que caracteriza o conhecimento.
Através desses métodos se obtém enunciados, teorias, leis, que explicam as condições que determinam a ocorrência dos fatos e dos fenômenos associados a um problema, sendo possível fazer predições sobre esses fenômenos e construir um corpo de novos enunciados, quiçá novas leis e teorias, fundamentados na verificação dessas predições, e na correspondência desses enunciados com a realidade fenomenal.
O método científico permite a construção conceitual de imagens da realidade que sejam verdadeiras e impessoais, passíveis de serem submetidas a testes de falseabilidade.
A ciência exige o confronto da teoria com os dados empíricos. A teoria deve poder ser submetida a um exame crítico. Segundo Popper, "um enunciado científico é objetivo quando, alheio às crenças pessoais, puder ser apresentado à crítica, à discussão". Um enunciado científico, construído mediante hipóteses fundadas em teorias, deve poder ser contrastado com a realidade, deve poder ser submetido a testes, em qualquer época e lugar, e por qualquer pessoa.
Isso faz com que a investigação científica estimule a criar fundamentos mais sólidos e a testar suas hipóteses de uma forma mais rígida e controlada.
A ciência se vale da crítica persistente que persegue a localização dos erros, através de procedimentos rigorosos de testagem que a própria comunidade científica reavalia e aperfeiçoa constantemente. Esse método crítico de constante localização de dificuldades, contradições e erros de uma teoria, garante à ciência uma confiabilidade.
Popper afirma que "uma explicação é algo sempre incompleto; sempre podemos suscitar um outro por quê, e esse novo por quê talvez leve a uma nova teoria, que não só explique, mas corrija a anterior". Essa auto-crítica sistemática da ciência, que muitas vezes conduz a uma reformulação de teorias, leva dogmáticos a afirmações injustas como: "a ciência nunca tem certeza de nada, o que ontem era verdade para ela hoje já não é mais". Estão certos quanto ao fato de que algumas verdades de ontem não serem mais aceitas hoje. Mas pecam quando generalizam, dizendo que a ciência nunca tem certeza de nada, ou vêem aí uma fragilidade. Ao contrário, é justamente por estar submetida a constantes retomadas de revisões críticas, que uma teoria científica é aperfeiçoada e corrigida, garantindo seu enriquecimento e confiabilidade.
O oposto ao espírito científico é o dogmático, que bloqueia a crítica por se julgar autosuficiente e clarividente na sua compreensão do mundo, e acaba por impedir eventuais correções e aperfeiçoamentos, muitas vezes induzindo ao erro, fraudes, ignorância e comportamento intolerante. É, portanto, errôneo achar que a dogmatização de um conhecimento é superior só porque é imutável.
O verdadeiro espírito científico consiste, justamente, em não dogmatizar os resultados de uma pesquisa, mas em tratá-los como eternas hipóteses que merecem constante investigação.
Ter espírito científico é estar, sobretudo, numa busca permanente da verdade, com consciência da necessidade dessa busca, expondo as suas hipóteses à constante crítica, livre de crenças e interesses pessoais, conclusões precipitadas e preconceitos.
Embora não se possa alcançar todas as respostas, o esforço por conhecer e a busca da verdade continuam a ser as razões mais fortes da investigação científica.
Francisco Saiz é professor de lógica e programação da Fundação Paula Souza, formado em Ciência da Computação pela Universidade Mackenzie, e aluno de mestrado em Inteligência Artificial no Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares da USP - Universidade de São Paulo

NUTRIÇÃO: Comida de conveniencia:novo habito alimentar

Comida de conveniência: novo hábito alimentar


Na Alemanha, consome-se cada vez mais alimentos industrializados. A vida moderna cria novos hábitos e muita gente mal sabe preparar uma refeição.

Molho de tomate à napolitana em vidro, mistura para suflê de brócolis em pacotinho, batatas descascadas e cozidas em lata, croissants pré-assados congelados, cozidos vários e misturas sem fim. Quem entra pela primeira vez em um supermercado alemão fica admirado com a variedade de produtos industrializados. E quem chega na prateleira dos temperos, arregala os olhos: mistura pronta de tempero para frango assado, peixe, sopa, comida chinesa.
Depois da fast food, a convenience food
Foram-se os tempos em que as pessoas conheciam os diversos ingredientes e sabiam que temperos e ervas ficam bem em que pratos. Depois que a fast food tomou conta do mundo, agora é a vez da convenience food (comida de conveniência, isto é, cômoda). Incipiente no Brasil, onde o consumo de alimentos frescos é grande, ela se alastra na Alemanha e nos países industrializados, garantindo taxas de crescimento invejáveis às indústrias do setor.
A vida moderna está mudando os hábitos alimentares. Nas grandes cidades, é comum ver gente jovem comendo na rua um hamburger, um döner kebab (churrasquinho grego) ou batatas fritas com maionese ou ketchup. Um número cada vez menor de alemães cozinham como se fazia décadas atrás e muitos nem sequer empregam mais os alimentos frescos básicos.
Menos batatas, mais congelados
O consumo de batatas, por exemplo, caiu em mais de 50% nos últimos 30 anos. Em compensação, o de congelados aumentou 83% nos últimos dez anos. Diante dessas tendências, um grupo de pesquisadores alemães está estudando como garantir uma alimentação boa, nutritiva e ecológica no futuro.

Um primeiro levantamento sobre os anos 90 revelou que, apesar da forte diminuição dos gastos com a alimentação, os alemães gastaram 30% a mais comendo fora de casa. O setor de fast food teve um aumento de 200%.
A "comida de conveniência" ganha terreno e vai desde salada lavada, cortada e empacotada juntamente com o tempero, passando por baguetes congeladas para esquentar no forno até sobremesas como pudim com calda, creme em potinho e sopas de pacote ou em lata.
Frutas o ano todo Ao mesmo tempo, diminui tanto o conhecimento sobre os alimentos, como o tempo empregado para cozinhar, constataram os pesquisadores. "As pessoas já não sabem quais são as verduras e frutas da estação", diz a chefe do projeto, Ulrike Eberle.

Quando a dependência da natureza era maior, todo mundo sabia isso. Hoje, porém, as importações enchem os supermercados o ano todo com bananas da América Central, abacaxis da África, mangas do Brasil, abacates de Israel, tomates do Marrocos e da Espanha, ou os pepinos cultivados independentemente da época, nas estufas da vizinha Holanda.
Micro-ondas e aromas
"O conhecimento sobre as origens do abastecimento cotidiano estão acabando", confirma Ulrich Oltersdorf, diretor do Instituto de Economia e Sociologia da Alimentação, em Karlsruhe. "Tem muita gente hoje que não sabe fazer nada na cozinha além de colocar algo no micro-ondas". E quem já viu como se faz a farinha do pão ou o leite da embalagem tetra pack?

O paladar das crianças já está acostumado aos intensos aromas artificiais da indústria alimentícia, adverte a Academia de Proteção à Natureza e ao Meio Ambiente, de Baden-Württemberg. Elas acabam achando sem graça o sabor natural.
Cozinhar, o novo luxo
No entanto, nem tudo é decadência dos costumes alimentares. Não apenas os hábitos, "os conhecimentos sobre nutrição também passam por um processo de mudança", diz a pesquisadora Ulrike Eberle. Hoje é comum que as pessoas saibam muito mais sobre as propriedades dos alimentos e conheçam a tabela das calorias.
Também é certo que aumenta o consumo dos alimentos considerados sadios - frutas, verduras, leite, cereais e seus derivados. Da mesma forma, estableceu-se um novo mercado para produtos orgânicos, comercializados em novas redes de lojas e supermercados.
E se não se cozinha mais no dia-a-dia, os gourmets e seus aprendizes passaram horas no fogão, no fim de semana. É como se cozinhar tivesse se tornado um luxo. Livros de culinária trazem receitas de todo o mundo e,na TV, canal que se preze tem diariamente um cozinheiro preprando delícias para todos os gostos.
Vida moderna e projeção de desejos
"Muitos de nossos desejos nós projetamos na comida", afirma Uwe Spiekerman, especialista em sociologia da alimentação. Para ele, os alemães que fazem questão de ter uma enorme cozinha luxuosa, com os mais modernos aparelhos, querem apenas refletir seu desejo de ter um alto nível de vida.

Não importa que essas cozinhas só sejam usadas de vez em quando para celebrar um dos novos rituais culinários no fim de semana. O estresse da vida moderna, a falta de tempo, que se estende cada vez mais às famílias, fará com que o setor da "comida de conveniência" continue crescendo.
Segundo o sociólogo, muitas vezes é justamente o desagrado com a vida cada vez mais rápida, complicada e cheia de novas técnicas que está por trás das críticas de uma alienação cada vez maior da comida originária.

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